11/11/2011

* MAIS ARTE. MAIS INFORMAÇÕES PARA O SÓCIO.

*

CENTRO MULTIARTE ROBERTO DRUMMOND

Iniciativa independente de um grupo de sócios no
Minas Tenis Clube ao escritor Roberto Drummond
entidade que ele era associado desde 1986.

*

MTC
Cultura. Esporte. Educação.

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 nas atividades, hoje cortadas.


EM CONSTRUÇÃO

* A VIDA EM BRONZE

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*

ROBERTO DRUMMOND
Escritor Brasileiro


Estatua em bronze exposta na Praça da Savassi, Belo Horizonte, BR.
 
 
Welington Almeida Pinto
 
Domingo de sol encoberto. Tempo frio, ameaçando chuvas. Bom para ficar em casa, abrir uma cervejinha, ouvir uma boa música e, quem sabe, acessar memórias e emoções guardadas no inconsciente.
Assim, como numa película, as lembranças de alguns companheiros de literatura começam a movimentar minha cabeça: do poeta Henry Correia de Araújo, Antônio Barreto, Blay Barbosa, Célius Aulicus, Chico Motta, França Júnior... Tanto que bateu uma vontade de sair de casa, e procurar um bardo daquele tempo para um bate-papo numa mesa de bar.
Pensei chamar o poeta Reis para visitar outro poeta: Paschoal Motta, no bairro Cachoeirinha. Mas, com um tempo feio desse, desisti. Achei melhor caminhar até o ‘Café da Travessa’ e, quem sabe, encontrar o Belisário, um dos poucos literatos que ainda encontro, vez ou outra, pelos bares da vida.
Saio de casa a pé, levando apenas um guarda-chuva. Desço a Rua Leopoldina , pego a Avenida do Contorno e, em poucos minutos, chego ao estabelecimento, na Savassi. Mas a casa estava fechada.
Sem ter mais o que fazer, eu atravesso a Avenida Getúlio Vargas e paro em frente à estátua de Roberto Drummond, plantada na praça Diogo Vasconcelos - praça que divide o fluxo de gente que vem todos os lados da cidade.
Surpreendo-me com o estado de conservação do bronze, que não está à mercê dos pombos e das intempéries. Parabéns!... Lentamente, giro o corpo em torno da estátua, sento-me num banco ao lado do escrevinhador, célebre por levar o tom de poesia à crônica esportiva brasileira.  Logo começo a imaginar mil coisas a respeito de quem já morreu e tem uma escultura em sua homenagem na região da cidade que tanto inspirou sua obra.
Roberto Drummond é a primeira pessoa imortalizada em um monumento que conheci na vida. Caso raro, eu sei. Lembro que dois dias antes dele se ‘encantar’, passando pelos jardins da Boa Viagem encontrei o companheiro parado numa das portas laterais da Igreja. Ao parar para cumprimentá-lo, a primeira coisa que perguntei foi o que fazia ali tão sozinho. Ele comprimiu o sorriso e disse: - Nada, perambulando.
Aguçado de novo pelas indagações, observo que uma ou outra pessoa adulta movida pela curiosidade, tocava no corpo estático do escritor comentando alguma coisa. Em seguida, duas crianças chegam e começam a brincar com a imagem de ferro. Primeiro, fingem tomar o livro que Roberto tem numa das mãos. Depois, divertindo e rindo à beça, elas pegam a se enroscar no corpo mineral do escritor.
Penso em voz alta:
 - Meu amigo, que saudade!... Sua lembrança na história da literatura brasileira é forte. Sabia, como ninguém, colorir uma narrativa esportiva de forma especial, como grande craque da palavra escrita.
Interessante!... Não há como negar, as estátuas são mesmo testemunhas silenciosas de um passado de glória. Tão confortantes à memória das pessoas que, na Europa, até as figuras menos célebres também são imortalizadas em praças públicas - na França, Mademoiselle Anne Marie, a queijeira que aprimorou a receita do queijo Camembert, está lá toda imponente na entrada de sua cidade, imortalizada em bronze.
- Bom dia, Roberto. Salve!...
 
Nota: Escritor brasileiro agraciado com “Prêmio Jabuti”, em 1975, pela publicação do livro A Morte de D. J. em Paris. Roberto Drummond escreveu O Dia em que Ernest Hemingway Morreu Crucificado" (romance, 1978), Sangue de Coca-Cola (romance, 1980) e Quando Fui Morto em Cuba (contos, 1982). Com Hitler Manda Lembranças (romance, 1984) e Ontem à Noite Era Sexta-feira (romance, 1988) iniciou uma nova fase em sua produção literatura, com enredos mais complexos. Em 1991, lançou seu maior sucesso, o romance Hilda Furacão, que foi adaptado para a televisão por Glória Perez, numa minissérie.


• FBN© 2006 * A VIDA EM BRONZE - Categoria: crônica. Autor: Welington Almeida Pinto – abril/2006 - Categoria: Conto – Gênero: Realismo Mágico - Autor: Welington Almeida Pinto – Original text: Portuguese - Iustr.:  foto Internet – Link.:  http://fantasticorealismo.blogspot.com.br/2012/06/blog-post_2421.html

* ATA DE FUNDAÇÃO DO MTC, REALIZADA EM 1935, NA SEDE DO AUTOMÓVEL CLUBE DE BELO HORIZONTE.

*

O MINAS EM MINHA VIDA
Capa da Revista do Minas, número 74 - ano VI, que circulou
 em novembro de 2011.





EM CONSTRUÇÃO

* BIBLIOGRAFIA - Acervo MTC

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Obras socilitadas à Diretoria do MINAS TENIS para serem catalogadas on-line.

* TELAS A ÓLEO, PAINÉIS, DESENHOS, ESCULTURAS - Acervo MTC

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* FOTOGRAFIAS - Acervo MTC

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* CURTAS - Acervo cinematográfico MTC

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* ABC - Nomes

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Estátua de bronze do escritor e jornalista Roberto Drummond, criada pelo artista Léo Santana, 
criada pelo artista Léo Santana.

Autor de sucesso no cenário da literatura brasileira. Entre seus livros publicados:
 'Quando fui morto em Cuba', 'Hilda Furacão' e 'Sangue de Coca-Cola'.

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* DEF - Nomes

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'Os caminhos da Felicidade'


Crônicas do Mundo - ROBERTO DRUMMOND - As 4 Perguntas
Crônica do escritor mineiro Roberto Drummond no Programa FEIRA MODERNA em 1996, produzido & dirigido por Breno Milagres para a ACTion CONTOS ...

* GHI - Nomes

*
QUATRO PERGUNTAS


Roberto Drummond no programa Feira Moderna,
produzido pela ACTion CONTOS DE MINAS em 1996 ...

* JKL - Nomes

*

Você se casaria com uma loura?

Crônicas do Mundo - ROBERTO DRUMMOND - As 4 Perguntas
Crônica do escritor mineiro Roberto Drummond no Programa FEIRA MODERNA em 1996, produzido & dirigido por Breno Milagres para a ACTion CONTOS ...

* MNO - Nomes

*
Roberto Drummond
jornalista e escritor mineiro

Depoimentos
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* PQRS - Nomes

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Belo Horizonte. Dia do Livro 2010



Flash mob#drumontão marca o Dia Nacional do Livro, comemorado
em 29 de outubro, sexta-feira, exatamente às 12h15 na Praça da Savassi, numa homenagem escritor Roberto Drummond, autor de Hilda Furacão, entre outros.

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* TUV - nomes

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Cabeça de Cristo

Óleo sobre tela - WAP - 1977



062 - Welington Almeida Pinto - welingtonpinto.blogspot.com
    
Literatura (03) - Artes visuais (03):


Primeiro ensaio:



ACONTECEU NAQUELE BAILE


              Welington Almeida Pinto

SÓFOCLES larga o jornal e levanta os olhos para o relógio na parede, que marcava nove horas da noite. Esfrega as mãos, ajeita o colarinho da camisa e se despede dos amigos na Sala de Leitura do clube. Desce a escadaria até o hall de entrada do Salão de Festas e fica ali um tempinho, passeando o olhar pela fila de mesas, quase todas ocupadas.
Apressadamente, escolhe uma entre as poucas vazias e se acomoda numa mesa de mogno escuro, coberta por um forro amarronzado, onde descansava o cardápio com capa de couro e o emblema do clube agasalhado pelas palavras: educação, cultura e esporte; ao lado um cinzeiro de metal.
Examina outra vez o salão, quase todo lotado, observando a gente das outras mesas, com a melhor cara do mundo de uma sociedade burguesa, exagerando no gestual de cordialidade. O rumor de vozes enchia o ar, como imenso coral festivo.
Em seguida estala os dedos solicitando a atenção de um garçom que servia logo adiante. Depois de um aceno de cabeça ele não demora atendê-lo.
- Boa noite, doutor.
- Oi. Não sou doutor, meu nome é Sófocles.
- Desculpe-me, senhor.
- Sem essa. Por favor, uma cerveja e dois copos.
- Brahma ou Antártica?
- Port, da Alterosa?
- Não. Trabalhamos apenas com as duas marcas.
- Então, a mais gelada.
- Alguma outra coisa, senhor?
- Por agora, não.
- A comanda, por favor – pede o garçon.
- Comanda!?....
- Não lhe deram uma folha de papel na entrada?
- Não. Quer dizer, sim. Desculpe-me, está no bolso do paletó.
- Obrigado. Trago a bebida em um minuto.
- Bem gelada, por favor – reforça Sófocles.
O moço sai e logo volta com o pedido.
- Com ou sem colarinho?
- Com.
O salão estava cheio. Barulho tão grande como o de um recreio de colégio. Os garçons se moviam como contorcionistas de circo fazendo um esforço heróico para melhor atender os clientes. Enquanto esperava pela cerveja Sófocles acende um cigarro, ainda entretido com as pessoas saudando uma às outras, falando, rindo, sentadas ou circulando pelo recinto - mulheres vestidas a rigor e homens com cara de acionistas de bolsa de valores.
Minutos depois as cortinas do palco se abrem e a orquestra começa a tocar. A iluminação clara e incandescente foi rapidamente trocada por uma mais fraca, deixando o salão numa leve penumbra com ar de sensualidade. Num instante os primeiros casais chegam à pista para dançar. Em seguida, outros e mais outros em diversos graus de intimidade: uns acanhados, outros mais empolgados e os mais contidos que mostravam no rosto rugas características de quem muito se preocupa com as coisas. Numa área, ao lado do palco, os mais jovens dançam separados; cada um com a alma mais agitada do que o outro, contorcendo o corpo para acompanhar o ritmo febril da música.
Encantado com a festa, mas ainda oculto na penumbra da garrafa escura de uma cerveja, Sófocles pensava que poderia convidar alguma moça para dançar. Logo, estende a cabeça para os lados, como quem quer aparecer para as mulheres sentadas ao redor e, também, para as que se misturavam no vai-e-vem do salão.
Do outro lado da pista, uma com os cabelos cor de palha e ares de garota, acomodada entre amigas, chama sua atenção. Trocando olhares cúmplices, vez ou outra, ele levantava a mão direita e baixava a esquerda, ou vice e versa, como se quisesse mostrar que não tinha aliança nos dedos – ela podia ver de onde estava. Até que, estimulado pelo flerte, ele eleva o copo, faz um brinde no ar e sorri retribuindo-lhe o gesto, como se fossem velhos conhecidos. Em seguida, sem vacilar fez-lhe um sinal de mão convidando-a para sua mesa. A moça balança a cabeça, concordando. Minutos depois, ela deixa seu lugar e se aproxima dele, sorridente:
- Ei.
- Olá, encantado.
O homem fica de pé, estende-lhe a mão e a convida para acompanhá-lo em um drinque, já puxando a cadeira. A moça agradece com um meigo rizinho nas faces e senta-se colando as mãos em cima da mesa.
- Obrigada.
- É um prazer.
- Sozinho?
- Sim. Solidão, às vezes, é bom. Equilibra corpo e alma.
- Isso é ótimo.
- É mesmo uma linda mulher! – observa Sófocles, entusiasmado.
- Ó, não!... Assim me encabula.
- Não precisa.
- É novo por aqui? – pergunta a moça.
- A primeira vez.
Ela ri com ar de surpresa.
- Que bom!
- Me sinto debutante! – brinca o homem, enquanto suas mãos caminhavam na toalha até encontrar-se com as dela. E se apertam.
- Seja bem-vindo – deseja a mulher.
- O salão é muito bonito, imponente.
- Meio art nouveau. Antigo, mas bem conservado.
- Claro.
- Aqui a gente se debruça sobre o passado e sonha com bons momentos vividos ao longo da vida. Desde mocinha freqüento esse salão de festas.
- Imagino.
- Gosta de dançar?
- Danço mal – responde o homem.
- Mesmo?
- Sim.
- Não tem importância, aqui ninguém liga – garante a mulher.
- Melhor assim. E você, o que deseja beber?
- Acompanho você na cerveja.
Sófocles imediatamente enche o outro copo.
- Um brinde aos seus belos olhos.
- Tintim. Um brinde à festa.
- Tintim – repete Sófocles, tlintlincando os copos.
- Sabia que toda sexta tem um bailinho?
- Ah, é!... Prometo ser um freqüentador assíduo.
- Vai gostar, logo-logo se enturma.
- Melhor. Qual o seu nome?
- Luciana. E o seu?
- Sófocles.
- Sófocles! Xará do dramaturgo grego?
- Meu pai era grande admirador da cultura grega. Mas, não sou nada trágico.
- Olha!
- Gosto dele.
- Nos tempos de faculdade li Édipo Rei. Adorei – revela Luciana.
Segundo Freud, representa o drama de todos nós.
- Será?
- Talvez sim, talvez não.
- Ai, que resposta mais vaga! – contesta Luciana.
- Achou? E você, o que faz na vida?
- Sou professora. Cursei Letras.
- Letras!
- Leciono no Estadual Central.
- Apenas ensina literatura ou escreve também?
- Não, não escrevo. Esse é um dom de poucos, mas sou uma leitora compulsiva.
- Então deve ser uma excelente professora.
- Me esforço.
- Sabe de uma coisa, adoro mulheres inteligentes. Para mim a inteligência feminina é também afrodisíaca.
- Afrodisíaca!!!
- Isso mesmo, afrodisíaca.
- Está brincando!... Quer dizer que a inteligência feminina excita?
- Muito – afirma o homem sorrindo.
- Ô louco! Meio cômico, mas...
- Mas?
- Deixe p’ra lá. E você, escreve?
- Sim. Ganho a vida produzindo textos.
- Jornalista?
- Publicitário. Mas, quando a inspiração bate faço literatura.
- Pelo jeito, deve bater sempre.
Depois de algum tempo trocando risos e palavras, Sófocles põe uma das mãos no joelho da mulher e permanece por um período admirando seus lábios, cobertos de vermelho. Elogia:
- Você tem uma boca bonita.
Antes que ela dissesse qualquer coisa:
- Os olhos também. Azuis como o céu de Paris.
- Paris!
- É. Conhece?
- Nunca fui a Paris. Mas, está me parecendo um observador perspicaz.
- O belo atrai, sempre.
A mulher ri, cheia de satisfação. Do longo vestido de organdi azul em que moldava o corpo bem feito, surgiam dois braços arredondados e claros, nus até os ombros, onde o homem, de leve, vez ou outra, depositava as mãos. E elogiava:
- Tem a pele tenra como veludo.
- Meu Deus!...
- Ah, o seu perfume!...
- Magriffe.
- Os franceses são os melhores.
- Também adoro. Posso revelar um segredo?
- Claro.
- Tenho medo de homens com mais de quarenta anos.
- Meu Deus, a idade que acha que tenho?
- Sim.
- Quando as pessoas me perguntam a idade sabe o que digo?
- Nem imagino.
- Eu digo: depende do dia.
- Ah, é? Por exemplo, hoje.
- Posso garantir que, por sorte, pelo menos por enquanto não represento perigo. Tenho trinta e nove, onze meses e vinte e um dias.
A moça ri descontraída. Depois filosofa:
- Aos 20, seu rosto é dado a você pela natureza. Aos 30, seu rosto é moldado pela vida. Aos 50, cabe a você merecê-lo.
- Fabuloso. Quem disse isso?
- Coco Chanel.
 - Não sabia que a estilista também filosofava.
- Pois sim. Não tem mais de quarenta anos, mas tem talento de sobra na arte da conquista. Muito perigoso para uma mulher sozinha. – afirma a mulher.
- Protesto. Sou inofensivo, puro. E por cima, tímido.
Risos.
Grandes focos azulados de luz, a todo minuto, riscavam as paredes e o teto do salão. Entusiasmado, Sófocles faz um sinal ao garçon que chega deslizando entre as cadeiras.
- Outra, por favor.
Luciana eleva os olhos. E um sorriso se precipita neles.
- Tive uma idéia: vamos dançar?
- Dançar?
- É, dançar.
- Daqui há pouco.
- Agora.
- Desculpe-me, querida. Enferrujado com estou, sinto que preciso beber mais um pouquinho; o álcool lubrifica as juntas de minhas pernas.
- Pena.
- Só mais um tempinho.
- Então... Então... Olha aqui, enquanto você pensa volto para a mesa de minhas amigas, certo?
- Já?
- Foi um prazer.
- Assim que tocar um bolero, tiro você p’ra dançar. Posso?
- Bolero?
- Dois p’ra lá, dois p’ra cá...
- Espertinho!
- Meu coração deseja vê-la novamente.
- Combinado.
Com a mesma expressão afetuosa e divertida, Luciana se levanta, despedindo:
- Tiauzinho.
- Espere.
- O que foi?
Sófocles, cada vez mais pensando no brilho dos lábios molhados da fêmea que pediam mergulho, toma um gole de cerveja e surpreende a mulher com um beijo furtivo, passando parte do líquido para a sua boca. Com a respiração anarquizada, ela abaixa a cabeça e deixa a mesa remexendo os quadris, rindo do gesto audacioso.
 A festa continuava acalorada. Antes do baile acabar, o homem decide ir embora. Deixa morrer sob os dedos a melodia que devolvia lembranças ligadas à sua mocidade. Entregue a esses devaneios, chama o garçom e paga a conta. Atravessa a porta principal do salão de festas do clube e toma o elevador, deixando atrás de si a felicidade resgatada pela música dos anos sessenta que ainda tocava: ... Óóóóhhh... Óóóhhh Diana, por favor...
- Valeu!... - suspira, enquanto pegava no bolso das calças a chave do carro, levando no olhar os olhos dela, acesos numa luz ponderada de brando brilho.

* FBN© 1996- Aconteceu Naquele Baile/Welington Almeida Pinto/Categoria: conto.



Óleo sobre tela

Estrada velha de Passos

Terceiro ensaio: Capítulo 2°, do livro 'Numa Noite em 68'
http://www.numanoiteem68.blogspot.com/  




ENCONTRO MARCADO


Welington Almeida Pinto


Sábado, 14 de dezembro, 1968. No dia da partida para Fortaleza, Mathieu acompanha José Renato até o aeroporto. Na volta, passa rápido pelo pensionato, onde morava, pega uma muda de roupa e segue direto para o apartamento do amigo. Pouco depois das nove horas da noite, deixa o elevador do Edifício Solar, precipita-se até a campainha, aperta e aguarda olhando contente ao redor. Num instante, aparece uma jovem mulher de cabelos aloirados, pele bronzeada e um olhar claro, festejando:
- Olha ele aí!
- Olê olá, Suzana. Boa noite.
Os dois se cumprimentam com apertos de mãos, trocando beijos nas faces.
- Atrasado, ‘né? – desculpa-se o rapaz.
- Não se preocupe. Chegou na hora certa.
- Nada britânico, reconheço. Em mim, a ponturalidade nunca foi um vício, reconheço.
- Ô, cara, que importância tem isso?
- É.
- Agora, por favor, me dê um abraço, estou sentindo falta do meu amigo.
Mathieu curva-se um pouco e abraça sua amiga com satisfação. Ela:
- Por favor, querido, entre..., entre e fique à vontade.
- Com sua licença.
- Sinta-se em casa, viu?
- Obrigado.
- Quer saber, nem vi o tempo passar, estava lendo.
- Ótimo. Ótimo. E ai, tudo nos trinks?
- More or less.
- Mais para mais?
- Hummmm!... Tentando, tentando.
- Muito bem.
Suzana estende um braço em torno do rapaz, sem apertar.
- Bobagens, bobagens. Vamos, sem cerimônia.
Mathieu entra. Brincando com um chaveiro numa das mãos atravessa o hall e se acomoda no vasto sofá da sala de visitas, composta por mais duas poltronas de camurça marrom e uma mesinha de vidro fumê no centro. Sobre ela, com ar de solenidade, uma estátua de Safo de Lesbos e alguns livros de arte, servidos à fome dos que adentram ao recinto. Das janelas pendiam cortinas de voal beje, bastante sóbrias.
- Seu apartamento é lindo – avalia Mathieu, sorrindo.
- Acha?
- Sua cara.
- Não, não é. Mais, muito mais a do José Renato.
O rapaz desconcerta-se com a ressalva da mulher. E logo desvia o olhar para a escultura na sua frente.
- Belíssima peça – analisa.
Suzana, já enrodilhada em outra poltrona, puxa algumas almofadas para junto de si, afirmando:
- Também gosto. Do escultor francês Claude Ramey. Clone, claro. A peça original está no Louvre.
O rapaz toca a obra com uma das mãos.
- Mostra a força erótica no mármore. Seios incríveis..., tudo perfeito.
- Parece viva, ‘né?
- Safo viveu na cidade de Lesbos, Grécia Antiga, entre os séculos VII e VI a.C. Poeta e ativista ela é considerada a primeira mulher que lutou por direitos iguais entre os seres humanos.
- Não sabia.
- Pois foi.
- Bom saber. José Renato gosta de estatuetas. O pai era colecionador e, nessa convivência, logo tomou gosto pela arte – explica a mulher com as faces entre as mãos.
- Também admiro.
Suzana aponta outra peça no canto de sua sala, explicando:
- Anjo justiceiro Michael.
- Sim.
- O olhar dele contempla o horizonte. Nos pés segura o mal. Nas mãos sustenta a balança da Justiça. Primoroso, ‘né?
- Arquétipo de Davi na luta contra o gigante Golias – alude o rapaz.
- Muito legal.
Mathieu respira fundo. E diz:
 - Vejo nas estátuas inquestionáveis testemunhas de um tempo de glória, concorda?
 - Claro. Claro.
O rapaz começa a observar o outro ambiente do salão. Nele, uma imensa mesa retangular, forrada por uma toalha de linho beije. Sobre o móvel uma cesta de frutas, uma garrafa térmica de café e um aparelho de telefone escuro. Nas paredes, entre outros quadros, destacava a pintura de uma moça com uma pomba na mão. Ele reconhece Suzana.
- Você, não é?
- Sim. Presente de casamento. Óleo sobre tela pintado pelo Chanina.
- Fascinante.
- O quadro ou a modelo? – brinca Suzana, rindo.
- Ambos. Ambos. Você está divina. Do pintor, gosto muito.
- Bárbaro.
- Um pouco melancólico o quadro, como se a envolvesse em terna cor de nostalgia diante da vida.
- Talvez.
- Mas é admirável. A expressão do rosto revela com seu jogo de verdes, ocres e azuis todos os traços de sua beleza externa e interna. Fala por si.
Suzana balança a cabeça, concordando. Mathieu:
- A ele, como Chagall, pouco interessa a luz e a sombra, a perspetiva e o desenho formal. Mas expressa como ninguém.
- Isso mesmo, mocinho.
- Querida, sempre foi moda enfeitar com o próprio retrato a parede da sala. Se a obra é assinado por artista de renome, aumenta o respeito do retratado.
- Ã-hã! Que nos diga José Renato – afiança a mulher, satirizando.
O rapaz sorri para ela com ternura. E continua excitado com os quadros pendentes nas paredes. No acervo, três telas reproduzindo o rosto de José Renato, assinadas pelos pintores Inimá, Chanina e Herculano, como se, juntos, o eternizassem ao resgatar também aspectos interior do retratado.
Suzana acompanhava o interesse do amigo pelas obras de arte de sua casa. Em silêncio, e bem à vontade na poltrona, acende um cigarro. Enquanto jogava fumaça no ar, oferece outro a ele:
- Aceita?
Mathieu teve, intimamente, um sorriso desdenhoso para o cigarro mentolado.
- Bem...
- Incomoda o fumacê odorífero?
- Nada a ver.
- Como fumo pouco, esses mentolados ou de cravo, são meus preferidos. Além de fracos, a carteira é bonita.
- Mas é fumo. Tem nicotina do mesmo jeito.
Suzana tenta justificar:
- Nem tragar eu trago.
- Mesmo numa relação eventual com o cigarro, você pode ser tragada pelo vício. A ciência está ai, cada dia mais, condenando o tabagismo. Acompanho as pesquisas.
- Mesmo assim, o meu amigo fuma.
- Difícil largar. Dá muito prazer, não dá?
- Ah, sim.
- Ao comprar um maço, o que a gente busca é repetir a sensação prazerosa que sintimos ao fumar um cigarrinho, descontraidamente. Não é mesmo?
- Claro.
- Sabia que, em meio aos jovens de hoje, cresce a idéia de que fumar é um ato de desafio às regras sociais do bom comportamento e da saúde?
- Percebo.
- Ah, Suzana, preciso deixar de ser cabeça-dura e parar de fumar. É um suicídio a longo prazo.
- Eu também – anui a mulher.
- Acontece que esses danados me ajudam a pensar. Enquanto tiro minhas tragadinhas as idéias pintam com mais energia - assegura o rapaz.
- Acredito. Aceita um mentolado? – volta a oferecer a mulher.
- Aceito.
Suzana estende a mão e passa-lhe o maço de tabacos.
- Se gostar pode ficar com a carteira. Tenho outra.
- Presente?
- Não é bem um presente, é um carinho.
- Obrigado.
O rapaz acende o cigarro. Depois de uma tragada, lenta e meticulosa, recosta-se na poltrona, justificando:
- Não tem jeito, numa boa conversa o tabaco é sempre bem vindo!
- Claro.
- Sem falar que é um ótimo tema para puxar a conversa, ‘né?
A mulher aquiesce com a cabeça, sorrindo.
- Então vamos ter uma prosa muito animada. Falo muito, como todas as mulheres.
- Não fico atrás, também adoro um bom papo. Ah, ia me esquecendo, trouxe uma lembrança para você.
- Para mim!... O quê?
- Um livro.
- Ó, quanta gentileza!... É o que mais gosto de ganhar.
- Imaginei.
- Obrigada. É um rapaz cortês, gratíssima.
Mathieu tira da bolsa a obra embrulhada para presente e oferece a ela:
- ‘A Bela do Senhor’, de Albert Cohen.
- Olha!...
- Fiquei na dúvida entre dois lançamentos. Esse aqui ou ‘Orgia’, de Túlio Carella.
- Acertou com Cohen. Numa outra oportunidade leio os diários eróticos do argentino.
- Cohen fala sobre o amor de Solal e Ariane que vivem uma aventura de fusão absoluta.
- Interessante – admira a mulher ao contemplar a capa. Logo, coloca o livro na estante ao lado.
- Comovente história de amor – afiança ele.
O rapaz, depois de saborear uma tragada no cigarro mentolado, exclama:
- Calorão, hein?
- Quase dez horas da noite e o ar ainda está bastante quente.
- Pelo que escutei na rádio os termômetros registraram 30 graus durante o dia. Sentiu?
- Sim.
- Quer um copo de água fresca?
- Boa pedida. Depois o café, se tiver na garrafa térmica, para fazer boca de pito.
- Tudo bem. Vou pegar.
Suzana deixa a poltrona, caminha até a mesa de jantar, enche um copo de água e uma xícara de café. Logo oferece ao amigo.
- Ainda está fria, toma.
O moço agradece e bebe a água num só gole. Em seguida, o café. E elogia:
- Bom seu café. Muito bom.
Suzana sorri agradecida. Em seguida, ressalta:
- Pelo que vejo gostou muito da pinacoteca do Zé.
- Muito. De peso, só de craques, provando que criação não inclui limites.
- Temos ainda uma cabeça de Cristo com sua assinatura. Recorda do quadro?
- Sim. Presente que fiz ao José Renato.
- Está numa das paredes do quarto de hóspede.
- Chique.
- Em um porta retrato, guardo meu perfil desenhado por você num guardanapo de papel, feito lá na beira da piscina do Minas Tênis, lembra?
- Como se fosse hoje.
- Onde, aliás, você fazia a maior média com as garotas, retratando todas que caiam nas suas artimanhas. Ainda é assim?
- Ora, Suzana, não passa de uma maneira de me comunicar com elas, criando imagens em suas mentes. Não nego que fico satisfeito com a aproximação das garotas. Fico sim.
- Espertinho. Melhor ainda se estivessem de biquínis, não?
- Bobeira.
- Acha?
- O biquini é, sem dúvida, a grande sensação nas praias do Rio. Mas..., mineiramente falando, posso dizer que os maiôs de hoje são tão leves e colantes que a nudez é sentida de maneira tão sensual quanto. Portanto, mais dia menos dia, o clube acaba com esse puritanismo e libera o biquíni. A pressão da moçada é forte.
Risos. Suzana agulha:
- Garoto esperto. Começa com a arte e a donzela logo acaba nos seus braços!
- Puts!
- Não é assim?
- Boba. Cadê o guardanapo com o desenho?
- Está sobre um móvel lá no meu quarto.
- Folgo em saber.
A moça, depois de um olhar comprido para ele:
- Bom de traço, cara.
- Ainda sou um estagiário com escasso domínio da técnica pictórica, pinto por recreação. Um dia viro pintor e retrato você de verdade.
- Jura?
- Prometo.
- Promessa é divida, viu?
- Vou pagar.
- Pinta sempre, Math? – interessa a mulher.
- Sou um escritor que, às vezes, pinta para ordenar melhor os pensamentos. Assim foi desde a adolescência, quando vivia rabiscando personagens em meus cadernos de escola, crente de que a vida deveria ter a cor que a gente pinta.
- Seria ótimo. Ótimo.
- Adoro retratar o corpo feminino, como todos que alimentamos alguma veleidade artística.
- Háháhá... Não podia ser diferente.
- Ora, Suzana, a arte está em toda parte. Mas, de todos os temas preferidos pelos pintores, uma bela mulher deve ser, de longe, o mais popular e o mais exaustivamente pintado.
- Sim. É o que a história da arte nos mostra.
- Desde a antiguidade.
- Me conta, você planeja antes o que vai pintar?
- Nem sempre. Estou mais naquela linha que, em vez de partir de intenções prévias, a obra de arte deve se definir no próprio ato de criação.
- Legal. Legal. Sempre pensei que a pessoa que já nasce com o dom de desempenhar alguma atividade artística tem que agradecer. É uma benção!
- Talvez.
- Não conheço uma pessoa que tenha sensibilidade pelo belo que não seja gente boa, viu rapaz?
Risos. Mathieu:
- Realizo-me nas duas vertentes da arte, mas a literatura é o meu grande interesse, dá a expressão maior . Na verdade, em qualquer suporte, a gente exterioriza o que temos por dentro. Concorda?
- Ah, sim.
- Suzana, a pintura é a minha segunda mania, uma paixão especial.
- Ah, é! E a primeira?
Mathieu solta uma risadinha divertida e revela:
- Viver de bem com a vida.
- Hummmm!... – admira Suzana.
Depois de uma longa golfada de fumaça:
- Quer saber, Math, fiquei mais sossegada quando o Zé disse que vinha.
- Jamais recusaria, somos amigos.
- Não sei. Os rapazes tem coisas melhores para curtir num sábado à noite.
- Bobinha. Estou aqui para fazer companhia e ter a sua companhia. Tem programa melhor?
- Espero que não.
Mathieu abre um leve sorriso de intimidade, lança os braços em volta do próprio corpo, acariciando-se. E avisa:
- Quero outro mentolado, pode ser?

- 02-




* FBN© 2011- Encontro Marcado/Welington Almeida Pinto/Categoria: Ensaio capítulo 2° do livro Numa Noite em 68  

 



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